domingo, 31 de outubro de 2010

O caso Angolano

Breve Introdução:

A reforma administrativa Angolana iniciou-se no 1990, mas o primeiro programa de reforma foi aprovado apenas em 2000, ou seja 10 anos depois, como veremos mais a frente.
O que verificamos é que o problema principal que enfrenta o actual processo da reforma administrativa está na sua própria nascença, e aqui aponta-se como principal motivo o facto de começar a ser feito algo apenas dez anos mais do que foi programado.
Importa também salientar que a reforma administrativa, foi no essencial, uma reforma de legislação.
O sistema singular que mais à frente iremos analisar e que é o ainda existente neste país, é o resultado da conturbada história angolana, desde o seu estatuto de colónia portuguesa, passando por uma independência conquistada através de mais de 10 anos de guerra colonial, imediatamente seguida de um longo e sofrido período de guerra civil até ao seu estatuto actual de potência económica em ascensão.

Etapas que caracterizam a Administração Pública Angolana:
a) Fase Colonial (até 1975):
Nesta fase destaca-se o lado da instalação de um claro predomínio da administração central sobre administração municipal, o Estado (movido pelo autoritarismo politico e pelo intervencionismo económico) converteu-se mais importante peça de todo o aparelho administrativo.
Houve um alargamento das suas funções, dos seus serviços e dos seus funcionários, verificando-se também a extensão da administração central suplantando a administração municipal.
Essa extensão da administração central foi acompanhada do surgimento de um controle ou predomínio do poder central sobre os órgãos locais.

b) Período Monolítico (1975 – 1991):
Com a Independência, Angola surge como Estado independente em 1975 (após um longo processo de 14 anos em que lutavam pela libertação), foi instaurado um regime político de partido único. Esta fase iniciou-se em 1975 e terminou formalmente em 1991, com a aprovação da Lei da Revisão Constitucional nº 16/91.
Neste período o modelo de organização administrativa angolano tinha um pendor fortemente centralizador, seguindo os princípios do “centralismo democrático”.
. Neste período, ao dar-se uma ruptura absoluta dos elos com o regime anterior, surgem diversos problemas, podendo acontecer que a segurança, a confiança e a certeza legítima dos cidadãos seja afectada, bem como se encontrava bastante iminente o perigo de subsistência e sobrevivência do Estado, que até então havia sido uma colónia.
. Perante tal situação, Angola optou pela continuidade do direito anterior constituído, desde que não contrariasse o espírito e objectivos da Constituição e do processo revolucionário.
O direito herdado era portanto o direito português, vigente em Portugal e na Província de Angola em 1975.

c) Fase Actual/Período Democrático (1991 – para diante):
O Estado Angolano deu início a um período de reforma administrativa em 1990, com a aprovação da Lei nº17/90 (Lei sobre os Princípios a Observar pela Administração Pública). Esta lei costuma ser considerada como o ponto de partida de todo o processo, no entanto, o mais correcto é estabelecer como momento do inicio das reformas o ano de 1988, com a aprovação do pacote legislativo do SEF (Saneamento Económico e Financeiro).
. Quanto ao Sistema Legal Angolano:
A Lei Constitucional de 1992 estabelece as linhas gerais da estrutura do governo e enquadra os direitos e deveres dos cidadãos. Baseia-se no sistema jurídico português e na lei do costume. No entanto vem-se a verificar que este sistema é no fundo bastante debilitado e tem como principais características a sua fragilidade.
. Quanto ao nível do desenvolvimento jurídico, só em 1995 e 1996 se verificaram as mais profundas alterações, com os novos códigos de actuação e contencioso administrativo.

Quanto à Actividade Administrativa:

O grande marco para a justiça Administrativa surge com o período da entrada em vigor daLei Constitucional que ainda se encontra agora em vigência, pois esta introduz uma inovação que diz respeito ao Principio da Legalidade. Através deste introduz-se a ideia de que todos os órgãos de Estado e a própria Administração Pública se devam reger pela Legalidade.
É ainda regulamentada uma vasta lista de direitos e interesses legalmente protegidos (decreto-lei nº4/96 de 5 de Abril) relativo à regulação do Contencioso Administrativo, vertente de impugnação de actos realizados pela Administração Pública.
Uma das grandes inovações a nível do contencioso administrativo é a criação de Tribunais Administrativos, com autonomia e estatuto diferentes dos Tribunais Comuns.

Dois Momentos a salientar:
- 1º República:
Verificou-se um profundo vazio no que toca à justiça administrativa. No entanto, aprovou-se a Lei do Sistema Unificado de Justiça (Lei nº18/88 de 31 de Dezembro – que como se vai ver na 2º Republica não comporta verdadeira unificação, e o que existe é um sistema de múltiplas jurisdições e de unidade material mitigada) que vem estabelecer um novo sistema judicial e integrado, bem como se aprovou a Lei nº17/90 de 20 de Outubro, que define quais os tribunais com competência para questões que digam respeitam à Administração Pública.
Um ano mais tarde, a Lei de Revisão Constitucional (Lei nº 12/91 de 6 de Maio) veio prever que os tribunais decidem a legalidade dos actos administrativos, o que vem efectivar o seu plano material.
- 2º República:
Nasce, como já foi referido em cima, a Lei Constitucional vigente.
A Administração Pública passa a subordinar-se ao princípio da legalidade, consagram-se direitos fundamentais dos cidadãos, e prevê-se a criação de Tribunais Administrativos, autonomizados dos comuns.
No fundo a Lei Constitucional de 92 consagra um monismo de judicatura e a solução encontrada para fundamentar a integração da jurisdição administrativa nos tribunais comuns é a da sua falsa especialização.
No final, conseguimos perceber que apenas houve uma evolução nominal e que nada se fez para construir fronteiras que garantam a celeridade processual e boa administração.

Podemos então concluir que o Direito Administrativo em Angola, perdeu-se no tempo e manteve-se pela mera consequência histórica ligados aos ideais clássicos de uma Super-Administração, que gera uma completa descontextualização em relação aos cânones do moderno Estado de Direito. É neste sentido e por estes argumentos que se torna necessário a tão desejada “Reforma”, para proteger cada vez mais os cidadãos face a Administração, constituindo o Contencioso, uma das áreas em que essa necessidade mais se sente.


Bibliografia:

SILVA, Vasco Pereira da. O contencioso administrativo no divã da psicanálise: Ensaio sobre as acções no novo processo administrativo. Lisboa, Almedina, 2005.

PACA, Cremildo. Direito do Contencioso Administrativo Angolano. Lisboa, Almedina, 2008

http://direitoadministrativofdul.blogspot.com/



Ana Sofia Rosmaninho Nunes
Nº 140107118

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Mais Tarefas

Aqui segue a indicação de mais tarefas:

1- Aprecie o modo como a legitinidade é tratada no âmbito do presente Código e como o era no passado. Quais as semelhanças e diferenças?
2- Quais as vantagens e inconvenientes de adoptar uma teoria unificada de direitos subjectivos públicos ou de adoptar antes um entendimento tripartido (direitos subjectivos, interesses legítimos e interesses difusos)?
Bom trabalho.

Vasco Pereira da Silva

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Evolução histórica do Contencioso Administrativo em Moçambique

O contencioso administrativo caracteriza-se por uma evolução dinâmica e por uma propensão para adquirir contornos singulares em cada uma das ordens jurídicas nacionais que o receberam.

Assim, o aparecimento e a evolução do contencioso administrativo em cada país acaba por espelhar o crescimento do país em si, e em Moçambique estas duas realidades – o aparecimento e evolução do contencioso administrativo; e a evolução da história do país em geral - podem ser divididas em dois períodos: uma fase colonial e uma fase pós-colonial.

A coincidência não é, no entanto, total. Em termos históricos o período colonial termina em 1975, porém a influência do colonialismo no direito irá sentir-se atè à reforma de 2001, com a aprovação da Lei sobre o Processo Administrativo Contencioso.

Antes de 1675, existia em Moçambique um género específico de governo denominado de “Capitania”. Estas Capitanias eram colónias, administradas por concessão, em que o Estado procedia a uma delegação de poderes soberanos no descobridor.

Não havia nesta época nenhum tribunal administrativo. A única garantia contenciosa que existia era a figura do “ouvidor” que aplicava um “direito privado”. Os juizes locais estavam submissos à autoridade dos capitães, o que, evidentemente, restringia a sua independência e a execução das suas decisões. Mais do que através de garantias contenciosas, os eventuais problemas administrativos eram resolvidos através de garantias graciosas.

Só em 1675 desaparece o “monopólio do capitão” e em meados do século XVII dá-se uma acentuação do processo de centralização do poder central. Ainda assim, e até 1752, altura em o Governo de Moçambique é separado de Goa, os territórios continuam a ser administrados de um modo quase medieval já que os magistrados que administravam a justiça eram seleccionados pelo rei: eles eram os ouvidores que auxiliavam/assistiam os capitães.

Nesta administração de tipo colonial e em que está patente a figura do capitão, vigora uma confusão de funções e uma justiça que podemos classificar de discricionária, graciosa e pessoal.

Como sabemos, e como tem sido frisado nas aulas e já neste blog, encontra-se na origem da recepção do sistema de administração executiva português uma forte influência do direito francês e, consequentemente, também na Província de Moçambique essa influência se irá sentir, originando o aparecimento de uma justiça administrativa.

Verifica-se então que em França, do princípio da autoridade absoluta do Estado e da doutrina da unicidade do poder, decorre uma separação entre a função judiciária e a administrativa e como tal a Administração Pública passa a ser considerada uma actividade específica que pertence ao Governo.

Nas palavras de Henrion de Pansey “Juger l'administration, c'est encore administrer”. A resolução dos processos contenciosos administrativos está entregue à Administração Pública e é consagrado um sistema do “Administrador-Juiz”, caracterizado por Grégoire Bigot como um “belo exemplo da ditura administrativa na resolução do contencioso”.

Este conceito de Justiça Administrativa foi difundido por vários países europeus e outros no mundo e em Portugal a importação deu-se com a aprovação da Reforma Administrativa de 1832 que culmina com a aprovação de um códgio administrativo bastante descentralizador – Código de 1836.

Este código foi substituído em 1842 pelo código de Costa Cabral que foi aplicado ao Ultramar e se pode dizer constituir o início da introdução, em Moçambique, de um sistema de administração executivo em que um órgão específico – tribunal administrativo – se encarrega da resolução de lítigios administrativos através de regras processuais próprias. Noutras palavras, foi com a aplicação do Código de 1942 que foi importado em Moçambique o sistema de administração executiva.

A influência da metróple na justiça administrativa moçambicana dura para lá da aprovação da Portaria que, em 1856 ,marca o nascer de um Direito Processual Administrativo Contencioso em Moçambique.

Só depois de 1869, com o surgimento de um Tribunal Administrativo se dá um processo de autonomização da justiça administrativa já que se produzem diplomas legislativos específicos para as províncias ultramarinas no sentido de melhor corresponder às situações particulares das colónias.

Efectivamente, é no Decreto de 1 de Dezembro de 1869 que é referido pela primeira vez o termo “tribunal administrativo”.

Este tribunal administrativo, o Conselho de Província, era composto apenas por administradores e funcionários.

Em 1907 dá-se a implementação de uma importante Reforma – a Reorganização Administrativa da Província de Moçambique – que pretendia acabar com uma centralização excessiva e introduzir uma concentração da autoridade e dos poderes em cada grau. Esta reforma embora tenha alterado a composição e alargado as atribuições do Conselho de Província, não atingiu os objectivos a que se propunha. Assim sendo, em 1913 é aprovado um outro decreto que vem reorganizar os serviços do Conselho de Província, tornando o Conselho mais judicial e profissional e atribui gratificações a vogais e juízes.

É no ano de 1922, a 28 de Janeiro, que é promulgada a Carta Orgânica de Moçambique, diploma da maior importância já que consagra pela primeira vez, explicitamente, a instituição do Tribunal Administrativo. A 26 de Julho do mesmo ano é publicado o estatuto do Tribunal Administrativo, Fiscal e de Contas de Moçambique.

Algumas das características deste diploma que me parece importante salientar são:

- A consagração do princípio fundamental de independência do Tribunal Administrativo em relação ao Poder executivo;

- A produção de efeitos dos acordãos do Tribunal administrativo é igual à das decisões dos tribunais judiciais;

- As sessões dos tribunais são públicas;

- O contencioso administrativo continua um contencioso de actos (e não de actividades);

- O princípio do contraditório é mencionado de forma expressa.

Em 1934 entra em vigor a RAU – Reforma Administrativa Ultramarina, que consagra uma Parte (V) relativa ao regime e organização do contencioso administrativo nas colónias.

Com a independência de Moçambique em 1975, é instituída uma democracia popular que visa a edificação de uma sociedade socialista em que a Administração verá reforçada a sua capacidade de acção e em que haverá o cuidado de respeitar a legalidade da administração.

Voltando à RAU há-que dizer que esta reforma não acompanha, no entanto, as necessidades sentidas pelo amadurecimento de uma moderna jurisdição administrativa e a própria RAU acaba por sofrer uma reforma em 2001 com a Lei de 9/2001 de 7 de Julho sobre o Processo Contencioso Administrativo.

A reforma de 2001 contribui para simplificar as relações tanto contenciosas como não contenciosas “susceptíveis de se estabelecer entre os administrados, utentes dos serviços públicos e particulares em geral, e as administrações do Estado ao nível central e local e administrações autárquicas.”, e pode ser lida aqui: http://www.ta.gov.mz/IMG/pdf/lei_9_2001.pdf.

Podemos então concluir, sem qualquer tipo de dúvida, que Moçambique é um país com regime administrativo em que a Administração Pública está sujeita a normas jurídicas diversas das do Direito Privado e onde existe uma jurisidição administrativa especializada.

Luísa Teixeira da Mota

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Origem do Contencioso Administrativo Português





Em Portugal o modelo françês de justiça administrativa verificou-se em 1832 através da célebre legislação de Mouzinho da Silveira, que proíbia os tribunais comuns de julgarem a administração e que instituía os Conselhos de Prefeitura e o Conselho de Estado embora este último apenas como orgão político.

O decreto nº23 de 16 de Maio de 1832 (Mouzinho da Silveira) foi a primeira lei em Portugal que separou as funções administrativas das judiciais, que pelo sistema das ordenações do Reino e mais legislação anterior se reuniam todas nos juizes,funcionários do estado, delegados do rei e seus agentes.

Por este decreto e ainda pelo decreto nº24 que estabeleceu a separação entre funções jurisdicionais e administrativas, entregando a tribunais especiais as funções jurisdicionais, procurou na verdade, o legislador assegurar a separação absoluta da justiça e da administração escrevendo-se no relatório:

“Senhor! A mais bela descoberta moral do século passado foi sem dúvida, a diferença de administrar e julgar; e a França que a fez lhe deveu desde logo a ordem no meio da guerra...”

Com o decreto nº23 de 16 de Maio de 1832 as questões contenciosas da administração pública entraram na competência dos tribunais administrativos com excepção dum curto periodo de tempo durante a monarquia liberal (1835-1842), (1892-1895) mas isto só para os tribunais de 1º instancia e de dois durante a Républica (de 7 de Janeiro de 1924 a 9 de Novembro de 1925 e de 4 de Setembro de 1926 a 27 de fevereiro de 1930).

Em Portugal adoptou-se quer o sistema françês, onde o principio da separação de poderes conduziu à existencia de tribunais administrativos privativos, quer o sistema belga onde o mesmo principio levou a consequências opostas, e é assim na vigência da Constituição de 1911,que o seu art 6º dispõe que são orgãos de soberania o Poder Legislativo,o Poder Executivo e o Poder Judicial independentes e harmónicos entre si.

O texto da autoria de Mouzinho da Silveira é considerado pela doutrina como a de Marcello Caetano um decalco da lei francesa de 1802, até mesmo a justificação introdutória da lei seria um resultado de uma tradução do texto françês.

A transposição simplificada do sistema administrativo françês não foi considerada a melhor, pelo menos foi desta opinião Marcello Caetano. Mas ao contrario do que seria de pensar a ideia inicial do sistema de contencioso administrativo português não surge como conquista do regime liberal. A possibilidade de impugnar os actos do poder lesivos aos direitos individuais ou contrários ás leis, bem como aqueles actos que prejudicassem direitos de terceiros remonta às ordenações afonsinas (secXV) noseu livro II, titulo 44 fala-se no meio para atacar e obter a anulação de diplomas,de alvarás, cartas, previsões, mercês e privilégios, contrários ao direito ou à utilidade pública ou que ofendam o direito adquirido por terceiro.


Bibliografia:


JUNIOR, José Lourenço-Contencioso Administrativo Português


SILVA, Vasco Pereira da- O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise


CAETANO,Marcello-Historia da Administração Pública- O Contencioso Administrativo


Tiago Gonçalves

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Comparação sistemas francês e anglo-saxónico

No sistema administrativo de tipo britânico, ou de administração judiciária podemos apresentar como principais características :

R Separação de poderes – O Rei foi impedido de resolver questões de natureza contenciosa por força da star chamber de 1641 e dar ordens aos juízes mediante o acto of settlement de 1701

R Estado de direito –O rei estava claramente subordinado ao direito, especialmente ao direito consuetudinário. O bill of rights determinou ainda que o direito comum era aplicado a todos os ingleses, incluindo o próprio rei.

R Descentralizarão – Ha uma clara distinção entre o central governmente e o local governmen. As autarquias locais gozam tradicionalmente de autonomia, não sendo meros instrumentos do governo central.

R Sujeição da Administração aos tribunais comuns – Administração pública esta submetida ao controlo jurisdicional dos courts of law

R Subordinação da Administração ao direito comum – Como consequência do rule of law, tanto o rei como os seus funcionários se regem pelo memo direito que os cidadãos anónimos. Todos os órgãos e agentes da administração publica estão submetidos ao direito comum não dispondo de privilégios de autoridade publica.

R Execução judicial das decisões administrativas – A administração não pode executar as suas decisões por autoridade própria. Estas decisões não tem força coerciva própria, necessitando de uma intervenção judicial.

R Garantias jurídicas dos particulares – cidadãos dispõem de um sistema de garantias contra as ilegalidades e abusos da administração.

No sistema administrativo de tipo Sistema administrativo de tipo francês, ou de administração executiva podemos apresentar como principais características :

R Separação de poderes – este principio foi proclamado com a revolução francesa. A administração fica assim separada da justiça.

R Estado de direito – Enunciam-se os direitos invocáveis pelo individuo contra o estado, no seguimento das ideias de Locke e Montesquieu. Em 1789 surge a declaração dos direitos do homem e do cidadão.

R Centralização – Por obra de Napoleão, os funcionários da administração central são organizados hierarquicamente. Assim teve que ser, uma vez que com a revolução francesa chegou uma nova elite dirigente ao poder.

R Sujeição da administração aos tribunais administrativos – Antes da revolução os tribunais comuns insurgiram-se contra a autoridade real. O poder politico teve de tomar providencias. Houve assim uma interpretação diferente do principio da separação dos poderes : se o poder executivo não podia intrometer-se nos assuntos da competência dos tribunais o reverso também não era permitido.

R Subordinação da Administração ao direito administrativo – os órgãos e agente administrativos não estão na mesma posição que os particulares. Dispõem de poderes de autoridade e de privilégios pessoais.

R Privilegio da execução prévia – É permitido á administração executar as suas decisões por autoridade própria. Estas decisões têm força executória própria e podem ser impostas pela coacção aos particulares sem necessidade de intervenção judicial previa

R Garantias jurídicas dos particulares – é oferecida aos particulares um leque de garantias jurídicas contra os abusos e ilegalidades da administração.

Confronto entre os dois sistemas :

Têm em comum a consagração da separação de poderes e do estado de direito. No entanto, são mais as suas diferenças do que as suas semelhanças. Quanto á organização administrativa, um é descentralizado e outro centralizado; Quanto ao controlo jurisdicional da administração, um entrega-o aos tribunais comuns, o outro aos tribunais administrativos; Quanto ao direito regulador da administração num é o direito comum, no outro o direito publico; Quanto á execução das decisões administrativas um fá-lo depender de sentença do tribunais enquanto o outro atribui autoridade própria a essas decisões; Quanto ás garantias jurídicas dos particulares, um confere aos tribunais poderes de injunção face á administração, o outro só permite aos tribunais administrativos anularem decisões ilegais, ficando a administração independente do poder judicial.

Nenhum dos sistemas parou no tempo, o que ditou uma aproximação relativa destes em alguns aspectos. Assim sendo :

R Organização administrativa – a administração britânica tornou-se mais centralizada. A administração francesa foi, gradualmente, perdendo o carácter de total centralização.

R Controlo jurisdicional da administração – Nestes campo mantêm-se essencialmente as características a cima mencionadas

R Direito regulador da administração – houve uma certa aproximação dos dois sistemas pois em Inglaterra houve um aumento do intervencionismo económico fazendo avolumar a função da prestação de serviços culturais, educativos e assistenciais da administração. A administração francesa teve de passar a actuar sobre a égide do direito privado.

R Execução das decisões administrativas – No século XX surgiu na Grã-Bretanha os administrative tribunals, órgãos administrativos independentes criados junto da administração central para decidir questões de direito administrativo. O direito administrativo francês concede aos particulares a possibilidade de obter dos tribunais administrativos a suspensão da eficácia das decisões unilaterais da administração publica.

R Garantias jurídicas dos particulares – são globalmente superiores no sistema britânico.

Isabel Mateus Dias. Nº 140107004

domingo, 24 de outubro de 2010

Reflexos Legais do Contencioso de Plena Jurisdição

• Breves considerações preliminares
Esta breve exposição sobre o contencioso de plena jurisdição surge no âmbito das “intervenções voluntárias” sugeridas pelo Professor.
Pretendo neste pequeno post demonstrar algumas das implicações práticas que surgem com a consagração do princípio da tutela jurisdicional efectiva.


• O CPTA expõe nos seus primeiros artigos uma panóplia de princípios fundamentais,
entre os quais se encontra o princípio da Tutela jurisdicional efectiva, respectivamente nos termos do art.2º do referido código.
O art. 2º do CPTA não é mais do que a concretização do preceito constitucional presente no art. 268º/4 da Constituição da República Portuguesa. Este artigo convoca para o contencioso administrativo a regra existente no processo civil de que a cada direito corresponde uma acção (Ver art.2.º, n.º2), i.e, cada direito ou interesse legalmente protegido encontra no Contencioso Administrativo a protecção adequada.
O CPTA não inova ao fazer corresponder a cada direito a uma acção, dando mero cumprimento a um direito fundamental consagrado constitucionalmente desde a revisão constitucional de 1997 – logo, o CPTA é direito constitucional concretizado.
O legislador procurou garantir a protecção plena dos direitos dos particulares através do desdobramento da tutela em 3 dimensões fundamentais:
a) O Contencioso oferece a quem a ele recorre formas processuais adequadas para fazerem valer as suas pretensões e terem sobre elas uma decisão que se pronuncie com força de caso julgado – plano da tutela declarativa.
No plano declarativo o princípio manifesta-se através da premissa de que todo o tipo de pedidos podem ser deduzidos e todo o tipo de condenações judiciais podem ser proferidas no âmbito da jurisdição administrativa – que deixa deste modo de ser uma jurisdição de poderes limitados à mera anulação de actos administrativos. Veja-se a este propósito o art. 4º ETAF, e art. 37º/2 CPTA (Tendo sempre como referência que se tratam de normas exemplificativas e não taxativas)

b) Plano da tutela cautelar – Um particular que procura na jurisdição administrativa a protecção dos seus direitos, pode ter necessidade de ver adoptadas medidas mais expeditas para que os seus direitos não sejam prejudicados enquanto se aguarda decisão definitiva, acautelando assim o efeito útil da decisão judicial. Ver art. 122º/1 CPTA.
c) Este princípio apresenta uma 3ª dimensão – a da tutela executiva. O Contencioso administrativo coloca à disposição de quem tenha obtido uma decisão jurisdicional com força de caso julgado, as formas processuais adequadas para que a mesma tenha execução prática. Logo, não só tem amplo poder declarativo como tem meios executórios próprios.

Estas três camadas do Princípio da Tutela Jurisdicional asseguram que a justiça administrativa não seja prosseguida por uma jurisdição de poderes limitados, nem “promiscuamente” ligada à Administração.

• Reflexos da plena jurisdição:

A consagração deste modelo constitucional de contencioso administrativo representa um passo significativo na “terapia” do mesmo, ajudando a superar os traumas da sua infância, e reflectindo-se maioritariamente em 5 aspectos:

1) Reconhecimento dos Tribunais Administrativos como pertencendo à ordem jurisdicional.
Consagrado no art. 9º da CRP, vem garantir que um particular que vê os seus direitos lesados pela administração pode dirigir-se directamente a tribunal.
Pode assim sustentar-se a caducidade, por falta de objecto, conexas com reclamação e recurso hierárquico obrigatórios (Ver art. 166º e seguintes do CPA).

2) Desaparecimento do recurso de anulação
Deixa de se falar em recursos – que transmitiam a ideia de uma apreciação em 2ª linha, por parte dos Tribunais Administrativos – para se utilizar a expressão acção.
Parece prevalecer a lógica do Cód. Processo Civil de que a cada direito corresponde uma acção adequada para o fazer valer (Ver arts. 37º e 46º CPTA). Dá-se então a emancipação do poder judicial administrativo face à administração (poder executivo).
3) Prevalência do Direito sobre a Legalidade actocêntrica – o verdadeiro escopo da acção.
Não está mais em causa a prossecução da legalidade no que concerne aos actos administrativos, mas sim a efectivação dos direitos dos particulares, direitos esses que podem ser lesados quer por acção quer por omissão da administração, no exercício de poderes discricionários ou vinculados.
Exemplo paradigmático: Responsabilidade Civil do Estado
Sem prejuízo de algumas excepções, os Tribunais Administrativos passam a ser competentes para decidir sobre todas as questões de responsabilidade civil extracontratual que envolvam pessoas colectivas de direito publico, não sendo essa a sua única competência quanto a esta matéria e, a esse respeito, confrontar o art. 4º ETAF com a Lei 67/2007.
4) “Uma modificação subjectiva da instância” – dos administrados às partes processuais.
Os particulares deixam de ser considerados administrados e passam a ser considerados parte legitima nos termos e para os efeitos do art 9º CPTA. Surge também o reconhecimento de que os órgãos da Administração prosseguem interesses próprios, sendo unicamente da responsabilidade do Ministério Público a prossecução da legalidade, i.e., o MP vai intervir no processo unicamente para averiguar questões conexas à legalidade da actuação da administração – ver art.85.º CPTA e 51.º ETAF.
A este respeito ver ainda os arts. 6º e 10º CPTA.
5) Dos poderes de pronúncia – da mera anulação à condenação.
Os tribunais administrativos deixam de ter como único poder a declaração de nulidade ou anulação de actos administrativos, uma vez que pode nem haver acto administrativo a sindicar. Os tribunais administrativos surgem então com uma nova amplitude de poderes, sendo a condenação à prática de acto devido o paradigma da plena jurisdição, uma vez que também tem implicação no âmbito dos poderes discricionários – arts. 66º e 71º CPTA.

• Em suma, os aspectos que abordámos são, em nosso entender, os de maior relevância no que respeita ao princípio da tutela jurisdicional efectiva dos particulares.

Bibliografia:
SILVA, Vasco Pereira da - O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise – Ensaio sobre as Acções no Novo Processo Administrativo
AMARAL, Diogo Freitas do; ALMEIDA, Mário Aroso de - Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo

Catarina Almeida Andrade
14106034

O exemplo francês e anglo-saxónico e a sua repercussão no sistema PORTUGUÊS e BRASILEIRO

Importa começar com uma referência à matriz do sistema francês sobre o qual cabe dizer que este surgiu com a revolução Francesa de 1789 e que teve como fundamento a ideia radical (e errada) que foi feita sobre o princípio da separação de poderes revelada na máxima de que “Juger l’administration, c’est encore une fois administrer’ e que leva a que se conceba como necessário um contencioso especial para a actuação de direito publico da administração. Especial porque funcionaria à parte de toda a lógica dos tribunais judiciais, atribuído a tribunais administrativos, isto é, a órgãos que apesar de independentes eram parte integrante da administração. Todo este contextualismo e as suas consequências correspondem àquilo a que o Profº Vasco Pereira da Silva chama metaforicamente de fase do “pecado original”, precisamente por razões politicas derivadas de uma desconfiança perante o poder judiciário dado que este foi o opositor do “Ancien Regime”. Utilizou-se o principio jurídico da separação de poderes com uma configuração que transforma a separação numa promiscuidade entre justiça e administração.
O contencioso regra era o recurso de anulação de decisões administrativas e que se resumia ao controlo da legalidade, não havendo contudo uma plena jurisdição pois o poder da autoridade que decidia era de (mera) anulação, isto é, não podia condenar a administração a praticar novo acto, nem tão pouco havia vinculação à execução das decisões. Os particulares eram aqui vistos como auxiliares da legalidade, veja-se a extensão do cunho objectivista que assim se revela. Como forma de tentar corrigir este modelo em 1799 é criado, em França naturalmente, o Conselho de Estado que, no entanto, funcionou ate 1872 com um modelo de justiça reservada, pois a partir daí dá-se o fim da necessidade de homologação das suas decisões pelo chefe de estado, ou seja, instaura-se o modelo de justiça delegada. É já em 1889 que o Conselho se arroga como juiz da jurisdição administrativa comum.Quanto ao sistema paralelamente distinto, o sistema britânico, este revelou-se um sistema de base subjectivista em que é a tutela dos direitos dos particulares o seu objecto principal.Por influência sua generaliza-se a ideia dos benefícios de ter um órgão jurisdicional independente a julgar a administração, surgindo assim o movimento europeu de judicializaçao dos tribunais administrativos na chamada fase do “baptismo”. A que se seguiu, nos anos 80 do século XX, a fase do “crisma”, que reafirma aquela judicialização e subjectivização, e subdivide na constitucionalização e na europeização.Em Portugal a evolução ocorre em moldes semelhantes ao exposto, sendo a CRP de 1976 o grande marco da judicialização, que se foi reforçando com as suas sucessivas revisões ate chegar ao estádio actual em que os tribunais administrativos são tanto formal como materialmente verdadeiros tribunais.No Brasil, sempre preponderaram as influências britânicas, apesar de o sistema actual ser de jurisdição una, ou seja, o poder de “dizer o direito” cabe exclusivamente aos tribunais judiciais. Isto, contudo, não impede, segundo uma parte da doutrina ainda que minoritária, uma vez que a maioria afirma que “não há contencioso administrativo no Brasil”, que se possa falar na existência de uma jurisdição materialmente administrativa. Existem inclusive nos tribunais federais e no STJ secções especializadas de contencioso administrativo, apesar de haver carência de um direito processual próprio e redução dos poderes da administração que se revelam como privilégios inaceitáveis na concepção moderna do Estado de Direito, sendo que isto vem sendo de certa forma amenizado pelo facto de o controlo exercido sobre os actos discricionários ser mais alargado do que ocorre em Portugal. Pode ser aferido o seu mérito tendo como base de legitimação o princípio da moralidade previsto na CRB.

Catarina Granadeiro
140107016

Evolução histórica do Contencioso Administrativo Francês

O contencioso administrativo francês, tendo sido a base, não só do contencioso administrativo português como o pilar da maioria das jurisdições europeias, tem uma importância primordial no desenvolvimento e vicissitudes da evolução dos sistemas administrativos europeus.
Resta-nos saber em que termos e quais foram os acontecimentos que “lhe deram vida” e de que forma influenciaram a sua evolução.


A fase do pecado original

O contencioso administrativo francês nasce com a Revolução Francesa e, como não podia deixar de ser, tendo a justiça administrativa nascido de um evento traumático, as consequências desse trauma fizeram-se sentir ao longo da sua evolução.
O “pecado original” do Contencioso Administrativo é o da promiscuidade entre as tarefas de administrar e julgar uma vez que a justiça administrativa nasceu dentro da administração. Os tribunais não podiam de forma alguma perturbar a justiça administrativa invocando a separação de poderes. No entanto este argumento foi usado de forma totalmente errada, uma vez que esta situação apenas reforçou a indiferenciação entre a função administrativa e a função judicial.
Para compreender este “trauma” é necessário recuar no tempo e perceber a influência de certas realidades teórico-culturais na da criação do contencioso administrativo. Nomeadamente a concepção de Estado e da separação de poderes, a reacção contra a actuação dos tribunais no Antigo Regime, a influencia do modelo do Conselho do Rei e a continuidade no funcionamento das instituições antes e depois da revolução.
O que está em causa com a Revolução Francesa é a criação de um novo modelo de Estado e a separação de poderes é vista como um elemento fundamental dessa mudança.
Por outro lado, esta perspectiva de “pecado original” deriva também de uma reacção dos revolucionários contra a actuação dos parlamentos do Antigo Regime que ajudaram na luta contra a concentração do poder régio e o receio de que os tribunais pudessem colocar um entrave à actuação da Administração, que se encontrava agora “em boas mãos”. As razões de desconfiança em relação ao poder judicial eram assim de natureza politica, uma vez que a sua actuação poderia perturbar a missão dos revolucionários.
É preciso não esquecer também que da Revolução Francesa não surgiu um sistema completamente novo, havendo uma continuidade de técnicas e instrumentos jurídicos de controlo da Administração antes e depois da Revolução. Pode-se, por isso dizer, que o Contencioso Administrativo francês traduz-se numa fusão entre “velhas receitas monárquicas”, conservadas do Antigo Regime, com novos princípios e ideias liberais nascidos na Revolução.
Podemos assim dividir a fase do pecado original do contencioso administrativo francês em 3 fases distintas: um primeiro período entre 1789 e 1799 em que o julgamento dos litígios é remetido para os próprios órgãos da Administração activa, gerando a tal confusão entre a função administrativa e a função judicial; um segundo período entre 1799 e 1872 onde se fala em “justice retenue”. Dá-se a criação do Conselho de Estado incumbido da resolução dos litígios administrativos, surgindo assim um “corpo meio-administrativo, meio-judiciario”; finalmente um terceiro período de 1872 para a frente, denominado “justice deleguée” em que as decisões do Conselho de Estado se tornam definitivas, por delegação de poderes do poder executivo.

Fase do Baptismo

A fase do baptismo corresponde à fase em que a Justiça Administrativa vai progressivamente ganhando independência em relação à administração adquirindo assim a natureza de uma jurisprudência autónoma. Esta transformação tem lugar na transição do Estado Liberal para o Estado Social (finais do século XIX e princípios do século XX) sendo consolidado com o Estado Providencia depois das Grandes Guerras do século XX.
Em França, são dois os eventos que vão marcar esta fase do Baptismo do Contencioso Administrativo.
O primeiro corresponde a mais um evento traumático, neste caso o “acórdão Blanco” de 1873 onde a sentença reconhece o direito de indemnização em caso de responsabilidade administrativa mas que simultaneamente o nega, condicionando esse direito em função das “necessidades de serviço”. Assim, este primeiro evento não augura um princípio auspicioso para a nova etapa do Contencioso Administrativo, criado mais com o objectivo de assegurar a primazia da Administração do que preocupado com a protecção dos particulares.
O segundo momento que marca esta fase é o reconhecimento e prestígio alcançado pelo Conselho de Estado que passa a ser um verdadeiro tribunal. É graças a este novo estatuto que o Contencioso Administrativo se vai progressivamente autonomizando do poder administrativo.
No entanto é claro que a Jurisdicionalização administrativa não se fez num só momento, resultando de um processo moroso e duradouro construído e desenvolvido a partir do fim do século XIX e ao longo do século XX graças às sucessivas actuações dos tribunais e por acção da jurisprudência; à continuidade de reformas do sistema legislativo e por intervenção do legislador.

Fase da confirmação

A fase da confirmação corresponde à fase actual do Contencioso Administrativo. Corresponde à reafirmação da sua natureza plenamente jurisdicionalizada em que o juiz goza de plenos poderes em face da Administração e também à consagração da sua dimensão subjectiva, destinada à protecção integral e efectiva dos direitos dos particulares.

A constitucionalização do Contencioso Administrativo francês

Em França a Jurisdicionalização plena do Contencioso Administrativo só vai terminar com o auxílio da jurisprudência Constitucional. É com os acórdãos do Conselho Constitucional, que reconhece que o Contencioso Administrativo deve ser apreciado por verdadeiros tribunais e que vê a defesa dos particulares como sua principal tarefa, que o Contencioso Administrativo vai ganhar autonomia definitiva.
Por outro lado, as reformas Administrativas também contribuíram fortemente para este desenvolvimento do Contencioso Administrativo. Tal é o caso da Lei 16 de Julho de 1980 que cria condições para a efectividade das sentenças dos tribunais administrativos, assim como para a utilidade do exercício de direitos processuais pelos particulares, ou da Lei de 21 de Dezembro de 1987 que trata da dimensão infra estrutural da Justiça Administrativa ao criar uma instancia intermédia “Courts Administratifs d’Appels”.

A europeização do Contencioso Administrativo francês

Em França, a europeização veio dar um grande contributo para a superação de “réstias” dos traumas de onde nasceu o Contencioso Administrativo.
São vários os princípios fundamentais, construídos pela jurisprudência a partir do Direito Europeu dos quais se destacam o direito de acesso à Justiça e o seu corolário do direito a um processo equitativo e o direito ao julgamento por um tribunal independente e imparcial, de onde se retira o princípio da inamovibilidade dos juízes administrativos.
A europeização do Contencioso Administrativo vai também dar origem a grandes transformações do Processo Administrativo por via legislativa, das quais se podem destacar a atribuição de poderes de injunção em procedimentos cautelares aos tribunais administrativos e a regulação dos direitos dos cidadãos nas relações de procedimento administrativo. Por outro ladoa transformação é ainda mais notória no que respeita a tutela urgente e cautelar com a criação de um “regime de urgência, confiado aos tribunais de primeira instancia, envolvendo três novos processos cautelares: suspensão, injunção e conservação susceptíveis de oferecer aos administrados garantias equivalentes às do processo civil.
Finalmente, no que toca à execução das sentenças administrativas foi a reforma de 1995 que veio regular o sistema, criando mecanismos sancionatórios específicos, as “astreintes” para coagir a Administração faltosa ao cumprimento das sentenças.


Assim, podemos dizer que a evolução do Contencioso Administrativo francês deriva de vários traumas que vão ter grande influência no seu desenvolvimento. O “pecado original”, nasce dos traumas daRevolução Francesa, dos seus ideais e das suas consequências . Os revolucionários veêm com maus olhos que os tribunais possam contrariar as decisões da Administração que se encontra agora em “boas mãos”. A fase do “baptismo”, em que a justiça administrativa começa finalmente a ganhar uma certa autonomia, sobretudo graças ao papel fundamental do Conselho de Estado, é amplamente marcada pelo caso Blanco onde se percebe que a protecção dos administrados, não é ainda nenhuma prioridade. Finalmente a fase da “confirmação” ou do “crisma” é marcada pela consagração Constitucional do novo modelo de Contencioso Administrativo e pela supressão das cicatrizes deixadas pelos traumas de uma infância difícil.


Sébastien Coquard
140107077

sábado, 23 de outubro de 2010

Sistema do Contencioso Administrativo Brasileiro

Enquadramento histórico

Desde os primórdios da civilização até a Idade Média, o ramo do Direito Administrativo encontrava-se “trancado” nas mãos de uma única pessoa, o soberano, o mundo vivia assim, sob o regime das monarquias absolutas, onde o rei jamais poderia ser submetido a qualquer julgamento estando os seus actos acima de qualquer ordenamento jurídico. Em 1789 dá-se a Revolução Francesa que provocando diversas e profundas alterações sociais e políticas, derruba a realeza e abre caminho para a criação de um Direito passa a equacionar a vontade dos súbditos.

Neste evoluir, com a expansão dos efeitos da revolução francesa e o seu contágio por todo o mundo, começa no século XIX o período que iniciou o desenvolvimento do Direito Administrativo. De notar que, esse desenvolvimento não seguiu sempre a mesma orientação e nesse contexto irei falar do caso específico do Brasil, que muitos consideram ter um sistema conciliador (entre o sistema francês e o anglo-saxónico).


O Sistema Administrativo Brasileiro de Jurisdição una:

· Pecado Original:

Em 1789, o Brasil era ainda uma colónia portuguesa mergulhada uma economia voltada para atender as necessidades da metrópole e uma sociedade escravista. O contraste entre a forma de vida dos portugueses e as mudanças na Europa e nos Estados Unidos, mostravam que a crise na colónia portuguesa seria inevitável. Na base desse mesma crise encontravam-se três momentos históricos, que também serviram de marco para o início da idade contemporânea.

O primeiro foi a chamada Revolução industrial, que teve início em Inglaterra no século XVIII e, que se deveu ao crescimento da indústria conjugado com o aumento da necessidade de mercados consumidores, o que por vez serviu para o rompimento do pacto colonial e o estabelecimento do livre comércio.

Em segundo lugar a Independência dos Estados Unidos, que adoptou como forma de governo a República e serviu de estímulo para outras colónias que ansiavam mudança, reclamando igualdade de direitos e o fim do abuso de poder por parte da nobreza.

Em 1789, ocorreu o terceiro e determinante momento histórico, a Revolução Francesa que, destruiu o Antigo Regime. A colónia portuguesa não ficou imune a todas as influências sociais, económicas e políticas provocadas por estes três momentos da história mundial, acabando estas por servir de base à formação de grupos contrários à dominação colonial, que pela primeira vez colocaram em causa o poder vigorante.


O ponto de partida para a elaboração do Direito Administrativo no Brasil aconteceu no dia 11 de Agosto de 1827, através da Lei 2ª, através da qual foram criadas cursos jurídicos e instaladas as Faculdades de Direito de São Paulo e Olinda. Em 1851, passou a ser obrigatório o estudo do Direito Administrativo, como matéria curricular (Decreto nº 608). No ano de 1857 foi publicada a primeira obra de Direito Administrativo, sob o título Elementos de direito administrativo brasileiro comparado com o direito administrativo francês, de autoria de Vicente Pereira do Rego.

A partir desse momento, o Direito Administrativo desenvolveu-se e consolidou-se com influência francesa, italiana e alemã.


· Baptismo:

O culminar dos momentos históricos acima referidos e da consequente expansão dos efeitos da revolta francesa a todo o mundo originaram assim, o fim da submissão ao poder imperial, com o chamado “Grito do Ipiranga” (mesmo contra a vontade do Príncipe D. Pedro) em 1822 e verificando-se a consagração prática de uma nova fase política.

A primeira consagração do modelo administrativo característico de um Estado Social de Direito ocorreu em 1891, com a adopção do sistema de jurisdição única, segundo o qual todos os litígios, independentemente da parte envolvida, (demonstração do passo dado no sentido da igualdade de facto) seriam resolvidos perante o poder Judiciário. Assim, as causas que envolvessem directamente actos da Administração seriam da responsabilidade das instâncias do Poder Judiciário. Não há, portanto, espaço para se falar em contencioso administrativo no Brasil, nos mesmos moldes em que ele se desenvolve em França, não sendo contudo de considerar que há uma impossibilidade de conjugação entre “contencioso administrativo e jurisdição una”.

Este sistema uno (ou o chamado sistema inglês), assenta na hierarquização dos tribunais para que possa existir revisão da decisão tomada caso as partes decidam intentar recursos e caso as decisões sejam passíveis de poderem ser recorridas. Seguindo as palavras de Hely Lopes Meirelles (jurista brasileiro, considerado um importante marco da doutrina administrativa): “o sistema de controlo judicial é aquele em que todos os litígios (de natureza administrativa ou de interesses exclusivamente privados) são resolvidos judicialmente pela Justiça Comum, ou seja, pelos juízes e tribunais do Poder Judiciário."


· Crisma/consagração – dividida em duas fases: 1ª. Constitucionalização e 2ª. Europeização

1ª Fase – Constitucionalização:

Ao contrário do ocorrido na França, parece não ter sido adoptada pelos constituintes brasileiros a interpretação feira por Montesquieu que assentava na premissa de que os poderes seriam meras funções, prova disso foi a “A Carta Política de 1988”, que se apresentou como a primeira experiência democrática após mais de 20 anos de regime autoritário e se apresentou como a reconfirmação da natureza jurisdicional do contencioso administrativo (embora diferente do modelo de contencioso originário francês).

Esta mesma Carta ou Constituição da República Federal reflectiu claramente a adesão a uma ampla definição de Estado Democrático de Direito, dando especial relevo à dimensão subjectiva, isto é, à efectiva e eficaz protecção dos cidadãos enquanto particulares, incluindo assim um extenso rol de direitos e garantias individuais e colectivas (artigo 5º), que limitando a interferência do poder do Estado quer na vida do cidadão quer no que respeita à sua dignidade, lhes confere o afastamento oficial dos longos anos de autoritarismo.

Actualmente, o Brasil continua a direccionar a sua política com base na Constituição da República Federal ou Carta Política de 1988 (sujeita ao longo dos anos a sucessivas revisões), que impede nos termos do sistema administrativo adoptado após a descolonização, que haja um qualquer litígio ou qualquer causa, não sejam analisados ou decididos pelo poder judiciário.

2º Fase: Europeização

Seguindo a sistematização apresentada pelo professor no seu livro e que serve de base à historicidade apresentada, não faz neste caso sentido desenvolver esta fase, uma vez que o Brasil não faz parte da União Europeia, não havendo meios de comparação como se de um país membro se tratasse. Não ignorando os existentes acordos entre o mesmo e instituições comunitárias da União Europeia.


Conclusão crítica:

Olhando para o modelo de Contencioso Administrativo originário da revolução francesa e o sistema de jurisdição una (ou sistema inglês), parece impossível a sua conjugação, contudo, ela torna-se passível de ser dada de forma positiva se tivermos em conta a importância da parte sujeita a jurisdição, e que no fundo, todo o processo é orientado para a salvaguarda dos seus interesses, sendo esse objectivo comum a ambos os sistemas ou modelos.


Nº140107095 - Ana Rita Antunes


Comparação dos sistemas Anglo-Saxónico e Francês da Justiça Administrativa

O estudo dos sistemas administrativos consiste na tipificação dos diferentes modos de estruturação da Administração Pública, visto que o modo jurídico de organização, funcionamento e controlo da Administração foram mudando consoante a época e o pais.

Historicamente, faz-se a divisão entre o sistema tradicional (que vigorou na Europa até aos séculos XVII e XVIII) e os sistemas modernos que se implantaram posteriormente. Para o que aqui nos interessa, iremos referenciar o sistema tradicional, o sistema britânico (ou sistema de administração judiciária) e o sistema francês (ou de administração executiva).

1. Sistema Administrativo Tradicional

O sistema administrativo tradicional corresponde ao sistema administrativo da Monarquia tradicional europeia e assenta em duas características fundamentais: por um lado, a indiferenciação das funções administrativa e jurisdicional – o que resultava na inexistência de uma separação de poderes – e, por outro lado, não existia subordinação da Administração Pública ao princípio da legalidade, resultando num sistema com insuficientes garantias dos particulares face à Administração e, consequentemente, na inexistência de Estado de Direito.

O Rei era supremo administrador e juiz ao mesmo tempo: exercia quer a função administrativa, quer a função judicial, e esta confusão destes dois poderes estendia-se também às outras autoridades públicas (os conselhos do rei, as câmaras municipais, etc.) Não existia uma separação de poderes, mas uma verdadeira confusão entre o poder executivo e o poder judicial.

As regras que existiam não constituíam um sistema, tratando-se de regras avulsas que podiam ser afastadas por utilidade politica ou conveniência pública e, em último caso, o monarca tinha no seu poder a possibilidade de dispensar quem entendesse de certos deveres, podendo atribuir-lhes privilégios. Não existia Estado de Direito, uma vez que as normas que vinculavam a Administração Pública eram maioritariamente relativas às relações entre os funcionários subalternos e os respectivos superiores hierárquicos. As normas não revestiam, na maioria das vezes, carácter obrigatório externo, ou seja, não conferiam quaisquer direitos aos particulares, face à Administração.

Esta situação foi vivida na Europa até ao final do período do absolutismo e veio a sofrer alterações profundas com as Revoluções que ocorreram em Inglaterra (1688) e em França (1789). Com estas revoluções, estabeleceram-se os sistemas administrativos modernos, que se baseavam na separação de poderes (os poderes do Rei foram divididos e atribuídos a órgãos distintos) e no Estado de Direito (proclamaram-se os direitos do homem como direitos naturais anteriores e superiores aos do Estado ou do poder politico).

2. Sistema Administrativo Britânico – Administração Judiciária

Com a separação de poderes, o Rei deixou de poder decidir sobre questões de natureza contenciosa (lei de abolição da Star Chamber -1641) e foi proibido de dar ordens a juízes e ainda de transferir ou demitir os mesmos (Act of Settlement – 1701).

Os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos britânicos foram consagrados na Bill of Rights (1689), onde também ficou determinado que o direito comum seria aplicável a todos os ingleses, fossem eles o Rei ou súbditos – consagrava-se, assim, o império do direito (Rule of Law).

Existia uma descentralização do poder em Inglaterra, distinguindo-se a administração central (central government) da administração local (local gorvernment). Estas autarquias locais foram sempre vistas como entidades independente e não como meras representantes do poder central, eram verdadeiros governos locais. Para reforçar esta ideia de autonomia, em Inglaterra não havia delegados gerais do poder central nas circunscrições locais (como existiu em França o “prefeito”).

A Administração Pública está sujeita ao controlo jurisdicional dos tribunais comuns porque ninguém pode invocar privilégios ou imunidades, uma vez que só há um sistema aplicável, quer ao Estado, quer aos particulares. Os tribunais aplicam os mesmos meios processuais às relações dos particulares entre si e às relações da Administração com os particulares, não havendo que procurar soluções para a Administração que sejam diferentes das soluções da vida privada.

A Administração Pública está subordinada ao direito comum, como consequência do Rule of Law, ou seja, o Rei, os seus conselheiros e funcionários regem-se pelo mesmo direito que todos os cidadãos comuns. Por regra, os órgãos e agentes da Administração Pública não dispõem de privilégios ou prerrogativas da autoridade pública e qualquer poder de decisão unilateral que lhes seja confiado por lei unilateral será sempre visto como uma excepção ao princípio geral do rule of law e não como parte de um sistema de direito administrativo.

As decisões unilaterais da Administração não têm em princípio força executória própria, ou seja, não podem ser impostas pela coacção aos particulares sem uma prévia intervenção do poder judicial. Isto significa dizer que se um órgão da Administração Pública tomar uma decisão desfavorável a um particular e este não a cumprir voluntariamente, o órgão administrativo não poderá agir coactivamente, terá que recorrer a tribunal de forma a obter uma decisão que torne aquele acto imperativo.

Os particulares cujos direitos tenham sido violados pode recorrer aos tribunais, solicitando um mandado ou uma ordem do tribunal à autoridade administrativa para pratique ou se abstenha de praticar determinada acção. Desta forma, os particulares têm um sistema de garantias que os protege da ilegalidade ou abuso da Administração Pública. Como os tribunais comuns gozam de plena jurisdição face à Administração, podem anular qualquer uma das suas decisões, bem como ordenar à Administração o cumprimento da lei, quer pela acção, quer pela omissão de determinados comportamentos. Trata-se de uma ordem que será cumprida por qualquer órgão ou agente da Administração Pública e a sua desobediência dá lugar à prisão.

3. Sistema Administrativo Francês – Administração Executiva

Com a Revolução Francesa foi expressamente proclamado o princípio da separação de poderes, o que resultou na separação da Administração e da Justiça, divida por órgãos diferentes.

Enunciaram-se os direitos subjectivos públicos que o particular apresentava face ao Estado.

O poder administrativo apresenta a característica da centralização, uma vez que se pretendiam implementar todas as reformas politicas, económicas e sociais, impondo novas ideias e combatendo muitas resistências. Desta forma, organizou-se um sistema baseado na hierarquia: o território francês seria dividido em departamentos chefiados por prefeitos, os municípios não apresentam autonomia administrativa e financeira, ou seja, as autarquias locais eram meros instrumentos administrativos do poder central.

Antes da Revolução, os tribunais comuns confrontavam várias vezes a autoridade real e mantiveram-se resistentes à implementação do novo regime, o que fez com que o poder politico adoptasse meios que impedissem intromissões do poder judicial no normal funcionamento do poder executivo. É aqui que nasce a promiscuidade entre a Administração e a Justiça, visto que se vai fazer uma interpretação diferente do princípio da separação de poderes: cria-se a proibição de os juízes conhecerem dos litígios contra as autoridades administrativas, e chega-se a criar tribunais administrativos que era, na realidade, órgãos da Administração Pública com a função de fiscalizar os próprios actos da Administração e o contencioso dos seus contratos e responsabilidade civil.

A tradicional distinção, nos países de família romano-germânica, entre direito público e direito privado permitiu a criação de um novo ramo do direito público – o Direito Administrativo. Caracteriza-se, nesta altura, por atribuir à Administração Pública poderes de autoridade de que os particulares não dispõem, uma vez que a Administração prossegue o interesse público e satisfaz necessidades colectivas, o que justifica determinados privilégios e mesmo imunidades pessoais que possam assegurar aqueles objectivos. A criação desta posição de superioridade da Administração tinha o seu fundamento na necessidade de impor as suas decisões aos particulares que se pudessem opor ao interesse geral, mas também apresentava uma submissão da Administração a especiais deveres e restrições, porque o seu comportamento estaria destinado à prossecução do interesse público.

Na prática, o direito administrativo acabou por conferir à Administração Pública um catálogo de poderes exorbitantes sobre os cidadãos, comparativamente às relações que estes mantinham entre si. Prova disso era a possibilidade da Administração poder executar as suas decisões por autoridade própria, aquilo que foi considerado o privilégio de execução prévia. Os órgãos administrativos, perante um incumprimento por parte de um particular de uma decisão administrativa que lhe fosse desfavorável, podiam por si só empregar meios coactivos que impusessem o respeito pela sua decisão, sem necessidade de obter de um tribunal autorização para tal. Tudo isto significa dizer que as decisões da Administração tinham força executória própria, sem qualquer necessidade de recurso aos meios judiciais.

O conjunto de garantias que eram oferecidas aos particulares não eram efectivadas através dos tribunais comuns mas sim através dos tribunais administrativos, o que significa que a Administração julgava os casos em que os particulares alegavam os seus direitos contra ilegalidades ou até abusos pela parte de órgãos administrativos. Os tribunais comuns eram independentes perante a Administração e a Administração era independente perante os tribunais comuns, ou seja, são as autoridades administrativas que decidem como e quando hão-de executar as sentenças que hajam anulado actos seus, o que diminuía muito os direitos e garantias dos particulares face à Administração.


Quadro comparativo dos dois Sistemas:

Sistemas Administrativos

Britânico

Francês

Pontos Comuns

Adopção do princípio da separação de poderes e do princípio do Estado de Direito

Tipo de Administração

Judiciária

Executiva

Organização Administrativa

Descentralização

Centralização

Controlo Jurisdicional

da Administração

Tribunais Comuns (unidade de jurisdição)

Tribunais Administrativos (dualidade de jurisdição)

Direito Regulador da Administração

Direito Comum (Direito Privado)

Direito Administrativo (Direito Público)

Execução das Decisões Administrativas

Depende de sentença do Tribunal

Dispensa a intervenção prévia do Tribunal

Garantias Jurídicas dos Administrados

A Administração encontra-se subordinada aos Tribunais Comuns, como a generalidade dos cidadãos

A Administração só pode ser condenada pelos Tribunais Administrativos na anulação de decisões ilegais das autoridades e no pagamento de indemnizações, estando independente do poder judicial.

Exemplos de Países que adoptaram este Sistema Administrativo

Estados Unidos da América (com algumas particularidades) e países da América Latina (Brasil)

Vigora em quase todos os países continentais da Europa Ocidental, embora possa sofrer variantes nacionais

Portugal adoptou este sistema


A evolução ocorrida no século XX veio aproximar estes dois sistemas administrativos nos seguintes aspectos:

A Administração Britânica tornou-se mais centralizada, devido ao crescimento da burocracia central, à criação de vários serviços locais do Estado e à transferência de tarefas e serviços para órgãos regionais, agora sujeitos à tutela e superintendência do Governo. Em França, começou-se a aceitar a autonomia de corpos intermédios, a eleição livre dos órgãos autárquicos, assim como a transferência de numerosas e importantes funções para as áreas regionais.

A Administração Inglesa continua sujeita ao controlo dos tribunais comuns, apesar do surgimento dos Administrative Tribunals e em França aumentam significativamente as situações em que a relação entre os particulares e o Estado é submetida à fiscalização dos tribunais judiciais, ou seja, a Administração começa a actuar muito sob a presença do Direito Privado.

Os dois sistemas aproximam-se na medida em que o Estado Social de Direito veio aumentar o intervencionismo económico em Inglaterra, aumentando as funções prestadoras da Administração Britânica, o que resultou no aparecimento de inúmeras leis administrativas e, consequentemente, de manuais e tratados ingleses de administrative law. No caso francês, verifica-se cada vez mais uma sujeição da Administração ao Direito Privado, visto que a Administração começa a lidar com regras de Direito Comercial, Direito Civil, etc.

Surgem na Grã-Bretanha órgãos administrativos independentes, criados junto da Administração Central, que vão decidir questões de direito administrativo que a lei manda resolver por critérios de legalidade estrita – são os chamados administrative tribunals. As suas decisões são imediatamente obrigatórias para os particulares e podem ser impostas coactivamente, se necessário, sem necessidade de recorrer previamente aos tribunais para a sua confirmação ou homologação. Por outro lado, Administração Francesa vem conceder aos particulares o direito de pedir a suspensão da eficácia das decisões unilaterais da Administração Pública, o que significa que as decisões da Administração só são executadas se um tribunal administrativo, a pedido do particular interessado, a tal não se opuser.

No que respeita às garantias que os particulares possuem face à Administração, pode-se dizer que, em Inglaterra, os tribunais não podem, em regra, substituir-se à Administração nos exercício dos poderes discricionários que a lei lhe atribui mas, no caso Francês, os tribunais administrativos ganham cada vez mais poderes declarativos face à Administração, ou seja, já podem mais do que a simples anulação de actos ilegais – podem declarar o comportamento devido pela Administração, sob pena de ilicitude dos actos, dos órgãos e agentes que desobedeçam.

Ambos os países adoptaram a mesma instituição de protecção dos particulares frente à Administração Pública – o Provedor de Justiça.

Quadro comparativo dos dois sistemas, após as alterações sofridas:

Sistemas Administrativos

Britânico

Francês

Tipo de Administração

Judiciária

Executiva

Organização Administrativa

Centralização

Descentralização

Controlo Jurisdicional

da Administração

Tribunais Comuns

Tribunais Administrativos

Direito Regulador da Administração

Direito Comum e Direito Administrativo

Direito Administrativo e Direito Privado (Comercial, Civil)

Execução das Decisões Administrativas

A Administração encontra-se subordinada aos Tribunais Comuns, como a generalidade dos cidadãos e surgem Tribunais Administrativos (critérios de legalidade estrita)

Cria-se a possibilidade da suspensão da eficácia das decisões unilaterais da Administração Pública

Garantias Jurídicas dos Administrados

Os tribunais não podem substituir-se à Administração no exercício dos poderes discricionários que a lei lhe atribui

Possibilidade de declarar o comportamento devido pela Administração, sob pena de ilicitude dos actos, dos órgãos e agentes que desobedeçam

A título de conclusão, resta-nos referir que, ainda que estes dois sistemas possam apresentar mais ou menos diferenças ou mais ou menos semelhanças, uma coisa é certa: a importância dada à protecção dos “administrados” e à defesa dos seus direitos é indiscutível. A evolução dos dois sistemas teve em conta uma ponderação entre a actividade administrativa – que envolve matérias conflituosas, uma vez que se destina a prosseguir o interesse público, o que choca constantemente com os interesses privados de cada cidadão, individualmente considerado – e a liberdade dos sujeitos, face à Administração – uma vez que, nas suas vidas privadas, se podem ver forçados a assumir certos comportamentos, mais ou menos perturbadores da sua liberdade e das suas garantias, face a um Estado que tem como dever cumprir o interesse de todos.


Bibliografia: Diogo Freitas do Amaral - Curso de Direito Administrativo, Vol. I, 2ª Edição, Almedina;


Maria Afonso

Nº de Aluno: 140104034